sábado, 5 de março de 2011

Estudo alerta que situação do “lince-ibérico está cada vez pior”


02.03.2011
Helena Geraldes
O sinal de alerta vermelho soa há 25 anos para o lince-ibérico. Mas apesar dos esforços, a situação da espécie “está cada vez pior”, diz um investigador espanhol que quis saber o que está a falhar e publicou o estudo na revista "Conservation Biology".
Francisco Palomares, investigador do CSIC (Conselho Superior de Investigações Científicas), não hesita em dizer que hoje, o lince-ibérico (Lynx pardinus) “está cada vez pior”, apesar de “todos os alertas e conhecimento acumulado”, disse ao PÚBLICO.

Em 16 anos, de 1985 – ano em que a União Internacional de Conservação (UICN) classificou a espécie como Ameaçada – a 2001, a área da distribuição geográfica e de reprodução da espécie decresceu. O número de fêmeas reprodutoras e de todos os indivíduos decaiu 86 e 93 por cento e oito das dez populações ainda existentes já desapareceram. Actualmente deverão existir 200 animais divididos por duas populações no Sul de Espanha, separadas entre si por 240 quilómetros. Estes dados fazem parte de um estudo que Palomares e a sua equipa de quatro investigadores publicaram na revista “Conservation Biology”, em Janeiro.

“Fizemos este estudo para que todos estejam conscientes da situação do lince, a fim de sermos capazes de identificar o que estamos a fazer mal e encontrar soluções eficazes”, explicou.

A investigação concluiu que as medidas de conservação, nomeadamente de melhoria de habitats, têm sido aplicadas “em várias áreas pequenas e separadas”, à excepção da intervenção em Doñana. “Um lince-ibérico adulto precisa de um território entre os cinco e os 15 quilómetros quadrados, o que significa que uma população de 50 fêmeas reprodutoras precisa de cerca de 500 quilómetros quadrados de habitat de qualidade”, escrevem os autores.

Em segundo lugar, “têm sido poucos os recursos investidos na monitorização científica do sucesso das medidas de conservação”. Por isso, “apesar de terem sido tentadas várias ferramentas de conservação, pouco se sabe sobre as razões do seu fracasso ou eficácia”, notam os autores do estudo. “Algumas medidas de conservação têm sido aplicadas há 20 anos sem sucesso mensurável.”

Os investigadores salientam ainda que, muitas vezes, os planos de gestão são decididos por responsáveis políticos com mandados curtos, até aos cinco anos, contribuindo para uma “falta de continuidade dos esforços”.

Por último, “quem está no terreno a trabalhar na recuperação do lince-ibérico tem uma confiança limitada no conhecimento científico”. Por vezes, “o conselho científico foi considerado quando já era demasiado tarde”. Segundo Palomares, os cientistas que se têm dedicado ao estudo do lince têm agora uma “sensação de esgotamento e desilusão”. “Os gestores não têm em conta as informações que apresentamos e, além disso, em muitos casos não facilitam que se continuem as investigações”.

Portugal deve ambicionar ter “importantes populações de lince”
Mas o lince ainda não é uma espécie perdida. “Acredito que para o lince não se extinguir é preciso fazer mais conservação efectiva no campo e, além disso, fazê-las melhor”, comentou Palomares. “Com apenas duas populações selvagens, as probabilidades de sobrevivência são muito baixas.”

Para o investigador, a “chave estará em ter várias populações vivendo em zonas extensas, pelo menos dez mil hectares, idealmente de 50 mil hectares”, com “uma boa abundância de coelhos, algum matagal mediterrânico e poucas infra-estruturas humanas”.

Portugal poderá “ter boas e importantes populações de lince. Essa deve ser a ambição de Portugal”, considerou Palomares. Papel “fundamental” será o dos caçadores. “É altura do colectivo de caçadores fazer do lince o seu emblema. Nunca haverá áreas protegidas de um tamanho suficiente para suportar uma população viável de linces a médio e longo prazo. Os linces terão de habitar áreas onde as pessoas façam um uso pouco intrusivo do meio natural. E um desses usos será, sem dúvida, a caça em dois países com tanta tradição cinegética como são Portugal e Espanha”, considerou.

O PÚBLICO pediu um comentário à entidade responsável pela conservação do lince-ibérico em Portugal, o Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB) mas não obteve resposta.

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